Contribuições da psicanálise freudiana ao estudo do suicídio : o papel do sentimento de culpa na autoagressão

Abstract

Resumo: Dados da organização mundial da saúde revelam que o suicídio e os comportamentos a ele relacionados vêm se tornando cada vez mais frequente no seio da sociedade contemporânea. Daí a necessidade de que o assunto seja cada vez mais debatido nos círculos psicanalíticos e nos centros de atenção à saúde mental. Vista a urgência de se compreender o assunto para melhor tratar a pessoa, uma vez que as diversas formas de autopunição são nefastas, chegando inclusive ao aniquilamento da existência real, a pesquisa teve como objetivo compreender a partir do referencial psicanalítico o fenômeno do suicídio. O aporte teórico é constituído principalmente pelos estudos de Sigmund Freud. Do diálogo entre os textos que compõem o referencial psicanalítico freudiano e alguns estudos realizados a partir deles, a pesquisa de caráter teórico-conceitual buscou esclarecer os possíveis processos psíquicos subjacentes a comportamentos associados ao suicídio. A hipótese deste trabalho é a de que a agressividade constitui um componente do sentimento de culpa, e de que a internalização daquela pode resultar no caráter hipermoral do Super-Eu, o que levaria à intensificação de um funcionamento autopunitivo. A partir do pressuposto daí decorrente, de que dependendo das situações vivenciadas a agressividade pode se voltar contra o próprio sujeito e se apresentar como forma de remorso, de angústia, como sentimento de culpa e, especialmente, como forma de autoagressão, delineou-se o presente estudo. Examina-se a articulação entre o sentimento de culpa, o caráter hipermoral do Super-Eu e a autopunição. Empreende uma reflexão acerca dos modos como a agressividade internalizada pode ser relacionada com o sentimento de culpa. O processo de investigação visa, mais especificamente, a analisar em que medida o sentimento de culpa pode ser o responsável pelo caráter hipermoral assumido pelo Super-eu; e, a partir disso, discutir como o caráter hipermoral assumido pelo Super-eu pode, por sua vez, ser o responsável pelas autopunições perpetradas pelo sujeito. Além disso, procura-se aprofundar a análise mediante a explicitação da hipótese freudiana da desfusão dos instintos de vida e de morte, a partir da qual a energia destrutiva associada ao instinto de morte ver-se-ia canalizada para o Supereu, podendo reforçar ainda mais a pressão destrutiva deste sobre o Eu, levando a uma exacerbação do sentimento de culpa inconsciente. A discussão sobre a desfusão instintual permitiu também compreender que a própria teoria pode oferecer possibilidades de pensar em formas de estimular processos vitais, que promovam a fusão instintual. Ou seja, que a própria concepção teórica que permite compreender os possíveis processos psíquicos subjacentes aos sofrimentos associados ao suicídio oferece, igualmente, fundamentos conceituais que possibilitam pensar em formas de intervenção que favoreçam destinos alternativos para a agressividade humana, que não a autodestruição. Espera-se, portanto que este trabalho possa não apenas contribuir com a discussão sobre a temática do suicídio, mas possa principalmente indicar algumas possibilidades de intervenção mais claramente fundamentadas.

Abstract: Data from the world health organization reveal that the practice of suicide has become more and more frequent in contemporary society. Hence the need for the subject to be increasingly debated in psychoanalytic circles and mental health care centers. In view of the urgency of understanding the subject in order to better treat the person, since the various forms of self punishment are harmful, even reaching the annihilation of real existence, the research aimed to understand from the psychoanalytic framework the phenomenon of suicide. The theoretical contribution consists mainly of studies by Sigmund Freud. From the dialogue between the texts that make up the Freudian psychoanalytic framework and some studies carried out based on them, the theoretical-conceptual research sought to clarify the possible psychic processes underlying behaviors associated with suicide. The hypothesis of this work is that the introjection of aggression is a component of the feeling of guilt, which results in the hypermoral character of the Super-Eu, which can be realized in self-punishment. Based on the assumption that follows, that depending on the situations experienced, aggressiveness can turn against the subject itself and present itself as a form of remorse, anguish, as a feeling of guilt and, especially, as a form of self-harm, present study. The articulation between the feeling of guilt, the hypermoral character of the Super-Self and self-punishment is examined. It undertakes a reflection on the ways in which the introjection of aggressiveness is related to the concept of guilt. The investigation process aims, more specifically, to analyze to what extent the feeling of guilt may be responsible for the hypermoral character assumed by the Super-eu; and, from there, discuss how the hypermoral character assumed by the Super-eu can in turn be responsible for the self-punishments perpetrated by the subject. Furthermore, an attempt is made to deepen the analysis by explaining the Freudian hypothesis of the defusion of death instincts, from which the destructive energy associated with them would be channeled to the Supereu, being able to reinforce even more the destructive pressure of this about the Self, leading to an exacerbation of unconscious guilt. The discussion about instinctual defusion also allowed us to understand that the theory itself can offer possibilities to think about ways to stimulate vital processes that promote instinctual fusion. In other words, the theoretical conception that makes it possible to understand the possible psychic processes underlying the suffering associated with suicide also offers conceptual foundations that make it possible to think of forms of intervention that favor alternative destinations for human aggression, other than the self-destruction of the person himself. . It is hoped, therefore, that this work can not only contribute to the discussion on the theme of suicide, but can mainly indicate some possibilities of intervention that are more clearly grounded.