Polidez e relações de gênero : as interações entre a linguagem e o sociocultural nas cartas de Fernando Sabino e Clarice Lispector

Abstract

A partir deste trabalho, propomo-nos a estudar as interações entre a polidez e as relações de gênero em cartas de dois escritores do século XX: Clarice Lispector e Fernando Sabino. O estudo explora a transdisciplinaridade dos estudos linguísticos e literários, uma vez que, à medida que contribui para estudos descritivos dos mecanismos de interação da (por meio da) língua, favorece a compreensão desses indivíduos tão relevantes para a literatura do país. Para tanto, apoiamo-nos nos estudos interacionais e pragmáticos de Brown e Levinson (1988), dos quais retiramos as proposições sobre polidez e as estratégias, de Fraser (2005), cuja ênfase otimista nos inspirou, e de Preti (2008), para o qual nos voltamos para entender o fenômeno da polidez/cortesia; nas contribuições conversacionais de Kerbrat-Orecchioni (2006) e em seus avanços na teoria de Brown e Levinson, nas considerações sobre identidade de Hall (2006), nas análises da questão do gênero agrupados por Ostermann e Fontana (2010), nos estudos de Eckert e McConnell-Ginet (2013), cuja perspectiva fundamenta nossa compreensão de gênero, na biografia de Gotlib (1995) e na trajetória compilada por Sabino (1999). A partir de quatro momentos ([1] o mapeamento e a descrição das estratégias de polidez utilizadas por cada missivista; [2] o estudo do contexto sociocultural de produção das cartas; [3] a recuperação dos contornos individuais das identidades de gênero de cada missivista; [4] a identificação dos mecanismos pelos quais tais indivíduos se engajaram, por meio da polidez, na construção de seu gênero), buscamos chegar em nosso objetivo: correlacionar a polidez às relações de gênero a partir da análise das missivas trocadas entre Sabino e Lispector. As análises revelam o seguinte: Fernando é mais polido que Clarice (Fernando tem 611 ocorrências de polidez e Clarice, 293); ambos possuem certa aproximação quanto ao emprego das estratégias (principalmente das do tipo negativa e híbrida); o estilo é utilizado para construir personae e como forma de engajamento em certas comunidades de práticas, as quais têm grande relação com os contornos do feminino e do masculino.

From this work, we propose to study the interactions between politeness and gender relations in the letters of two twentieth-century writers: Clarice Lispector and Fernando Sabino. The study explores the trans-disciplinarity of linguistic and literary studies, since, as it contributes to descriptive studies of the interaction mechanisms of (through) language, it favors the understanding of these individuals so relevant to the country's literature. We draw on the interactional and pragmatic studies of Brown and Levinson (1988), from which we draw the propositions on politeness and strategies, Fraser (2005), whose optimistic emphasis inspired us, and Preti (2008), to whom we turn to understand the phenomenon of politeness/courtesy; in Kerbrat-Orecchioni's (2006) conversational contributions and her advances on Brown and Levinson's theory, in Hall's (2006) identity considerations, in the analyses of the gender issue grouped by Ostermann and Fontana (2010), in Eckert and McConnell-Ginet's (2013) studies, whose perspective grounds our understanding of gender, in Gotlib's (1995) biography, and in the trajectory compiled by Sabino (1999). From four moments ([1] the mapping and description of the politeness strategies used by each letter writer; [2] the study of the sociocultural context of the letters' production; [3] the recovery of the individual contours of the gender identities of each letter writer; [4] the identification of the mechanisms by which such individuals engaged, through politeness, in the construction of their gender), we seek to arrive at our goal: to correlate politeness to gender relations from the analysis of the missives exchanged between Sabino and Lispector. The analyses reveal: Fernando is more polite than Clarice (Fernando has 611 occurrences of politeness and Clarice, 293); both have a certain approximation in using strategies (mainly of the negative and hybrid type); style is used to build personae and as engagement in certain communities of practice, which have a great relation to the contours of femininity and masculinity.