A ciência romântica de A.R Luria : a busca por uma psicologia concreta

Abstract

RESUMO: Este trabalho é o resultado de uma pesquisa teórico-conceitual sobre o conceito de ciência romântica na perspectiva do psicólogo e neuropsicólogo soviético Alexander Romanovich Luria. O objetivo foi investigar como Luria se apropria dessa tradição em suas publicações, com destaque para as "narrativas clínicas", O homem com um mundo estilhaçado e A mente e a memória. Partimos da hipótese de que a ciência romântica de Luria compartilha afinidades teórico-filosóficas com o ideal de psicologia concreta, como discutido por Georges Politzer e Lev Semionovitch Vygotsky. No cerne dessas afinidades está a incorporação da "dramaticidade da existência social dos seres humanos" na análise dos processos psicológicos, como forma de superar o reducionismo nos estudos de casos clínicos e como modo adequado de expressão de análise sindrômica. A exploração dessa hipótese orientou a organização desta tese em quatro capítulos. No primeiro capítulo, analisamos os conceitos que exercem um papel de influência direta na constituição da ciência romântica de Luria: o Romantismo e a Ciência Romântica do século XIX. No segundo capítulo, situamos o ideal da psicologia concreta e a categoria "drama" nas propostas de Politzer e Vygotsky, delineando as similaridades e diferenças com a ciência romântica. No terceiro capítulo, apresentamos breve panorama da vida e obra de Luria, especificamente suas elaborações teóricas e práticas no campo da neuropsicologia, destacando o conceito de cérebro histórico-cultural e conceitos básicos. Na sequência, buscamos caracterizar o conceito de ciência romântica de Luria, apresentando uma síntese das duas "narrativas clínicas" supracitadas, bem como interpretações contemporâneas que destacam suas particularidades, a partir de dois autores: Oliver Sacks, o qual defende o conceito de "narrativas clínicas" diferenciando-as dos "estudos de caso" por preservarem o drama humano da pessoa concreta e não apenas o curso da doença; e Hannah Proctor, cuja leitura da ciência romântica e da história social soviética na obra de Luria demonstra que suas histórias de caso clínico guardam um potencial crítico no cenário de reducionismo neurocientífico contemporâneo, devido ao modo dialético com que retrata a relação entre a individualidade e o contexto histórico-social. Nas conclusões, destacamos a interpretação de que a ciência romântica de Luria expressa demandas da psicologia concreta, tais como a historicidade e a dramaticidade da existência social dos seres humanos, através da síntese entre as artes e a ciência. Essa ênfase se reflete na ciência romântica luriana na incorporação da dramaticidade social da existência humana na análise dos processos psicológicos e na investigação clínica em estrutura de narrativa. Desse modo, a ciência romântica permanece um valioso modelo de abordagem e escrita científica para futuras práticas psicológicas fundamentadas na Psicologia Histórico-Cultural

ABSTRACT: This work is the result of a theoretical-conceptual research on the concept of romantic science from the perspective of the Soviet psychologist and neuropsychologist Alexander Romanovich Luria. The aim was to investigate how Luria appropriates this tradition in his publications, focusing on the "clinical narratives," The Man with a Shattered World, and The Mind and Memory. We hypothesized that Luria's romantic science shares theoretical and philosophical affinities with the ideal of concrete psychology, as discussed by Georges Politzer and Lev Semionovitch Vygotsky. At the core of these affinities lies the incorporation of the "dramaticity of human social existence" in the analysis of psychological processes, as a way to overcome reductionism in clinical case studies and as an adequate mode of syndromic analysis expression. The exploration of this hypothesis guided the organization of this thesis into four chapters. In the first chapter, we analyze the concepts that play a direct role in the constitution of Luria's romantic science: Romanticism and 19th-century Romantic Science. In the second chapter, we situate the ideal of concrete psychology and the category of "drama" in the proposals of Politzer and Vygotsky, delineating the similarities and differences with romantic science. In the third chapter, we present a brief overview of Luria's life and work, specifically his theoretical and practical elaborations in the field of neuropsychology, highlighting the concept of historical-cultural brain and basic concepts. Next, we seek to characterize Luria's concept of romantic science, presenting a synthesis of the aforementioned two "clinical narratives," as well as contemporary interpretations that highlight their particularities, from two authors: Oliver Sacks, who defends the concept of "clinical narratives" distinguishing them from "case studies" by preserving the human drama of the concrete person and not just the course of the illness; and Hannah Proctor, whose reading of romantic science and Soviet social history in Luria's work demonstrates that his clinical case stories hold critical potential in the contemporary neuroscientific reductionism scenario, due to the dialectical way it portrays the relationship between individuality and historical-social context. In the conclusions, we highlight the interpretation that Luria's romantic science expresses demands of concrete psychology, such as the historicity and dramaticity of human social existence, through the synthesis of arts and science. This emphasis is reflected in Luria's romantic science in the incorporation of the social dramaticity of human existence in the analysis of psychological processes and clinical investigation in narrative structure. Thus, romantic science remains a valuable model for scientific approach and writing for future psychological practices grounded in Historical-Cultural Psychology