Depressão na adolescência : considerações acerca dos aspectos que promovem o sofrimento psíquico à luz da Psicologia Histórico-Cultural

Abstract

RESUMO: A depressão, por si só, se constitui como um fenômeno que requer atenção e, quando incide sobre fases tão precoces da vida como a adolescência, torna-se uma urgência em termos de saúde mental. Contudo, abordar esse fenômeno em sua complexidade vai muito além de olhar apenas para o indivíduo. Seguindo os preceitos da Psicologia Histórico-Cultural, o homem nasce candidato a ser humano, mas somente humaniza-se, isto é, adquire aquilo que lhe é necessário para viver em sociedade a partir de suas interações com seu meio social, que lhe permitirão apropriar-se das produções socialmente elaboradas, internalizando seus usos e significados. É nesse movimento que se constituem até mesmo os elementos mais subjetivos, como as emoções, os sentimentos e a própria personalidade. Logo, para compreender por que adolescentes deprimem, há que se questionar como o meio em que eles estão inseridos tem se configurado. É nesse sentido que esta pesquisa foi realizada com o objetivo principal de investigar o sofrimento psíquico que acomete adolescentes e que vem sendo descrito como depressão, buscando compreender os aspectos que estão na gênese desse sofrimento e as consequências específicas para essa fase do desenvolvimento. Para tanto, realizou-se uma pesquisa de campo em que foram entrevistados sete adolescentes que se encontravam deprimidos, buscando, em suas falas, os fatores que contribuíram para o surgimento do quadro. As entrevistas, individuais, foram realizadas em modalidade recorrente, gravadas e, posteriormente, transcritas. A partir das transcrições, foram delineados eixos de análise, discutidos à luz da Psicologia Histórico-Cultural. Obteve-se como principal conclusão a ideia de que a sociedade, tal qual organizada a partir do modo de produção capitalista, prima pela produção de mais-valia e, para tanto, lança mão de uma série de recursos que tornam as relações, sejam elas de produção, de intercâmbio, afetivas, de serviço etc., efêmeras, incongruentes e alienadas, criando um cenário caótico e adoecedor. Os indivíduos, inseridos nesse contexto, apropriam-se de tais características, transladando ao aspecto subjetivo a mesma instabilidade, de modo que os adolescentes se veem sem referências e os adultos tornam-se pouco eficazes na ação de amparar, direcionar e proporcionar condições de desenvolvimento às gerações posteriores. Assim, os adolescentes têm vivenciado o desenvolvimento e o processo de requalificação do psiquismo, próprios dessa fase, de modo desorientado e sem propósito, e não têm claramente delimitados seus interesses, necessidades, motivos. Também não conseguem elaborar recursos psíquicos saudáveis para lidar com as experiências que lhe são impostas e, nesse processo, deprimem. Diante dessas considerações, compreende-se que a depressão na adolescência, tal qual se apresenta, não é uma doença com causas pontuais ou uma síndrome, mas uma consequência de um meio cada vez mais hostil à saúde mental.

ABSTRACT:Depression in itself is a phenomenon that demands attention and, when it affects such early stages of life as adolescence, it becomes an urgent mental health issue. Nevertheless, approaching this phenomenon in its complexity extends far beyond just looking at the individual. According to the precepts of historical-cultural psychology, the human being is born as a candidate to be human, but only becomes humanized, that is, acquires what is necessary for living in society through interactions with the social environment, which allows him/her to appropriate socially elaborated productions, internalizing their uses and meanings. It is in this movement that even the most subjective phenomena are formed, such as emotions, feelings and personality itself. Therefore, in order to understand why adolescents become depressed, we need to question how the environment in which they live has been configured. It is in this sense that this research was carried out with the main objective of investigating the psychological suffering that affects adolescents and which has been described as depression, seeking to understand the aspects that are at the root of this suffering and the specific consequences for this stage of development. To this end, a field study was carried out in which seven adolescents who were depressed were interviewed, looking for the factors that contributed to their condition. The individual interviews were held in recurring mode, recorded and later transcribed. From the transcripts, axes of analysis were delineated and discussed in the light of historical-cultural psychology. The main conclusion obtained was that society, as organized under the capitalist mode of production, strives to produce surplus value and, to this end, makes use of a series of resources that make relationships, be they production, exchange, affective, service, etc., ephemeral, incongruous and alienated, creating a chaotic and sickening scenario. Individuals, inserted in this context, adopt these characteristics, transferring the same insecurity to the subjective aspect, so that adolescents find themselves without references and adults become ineffective in supporting, directing and providing conditions for the development of subsequent generations. As a consequence, adolescents have experienced the development and re-qualification process of the psyche, which is typical of this phase, in a disoriented and purposeless way. They don't have a clear definition of their interests, needs and motives, nor are they able to develop healthy psychic resources to deal with the experiences imposed on them and, in the process, they become depressed. In the light of these considerations, it is understood that depression in adolescence, as it appears, is not a disease with specific causes or a syndrome, but a result of an environment that is becoming increasingly hostile to mental health.